quarta-feira, 30 de abril de 2014

Anti-sala


Gostar de um jogo é uma coisa. Recomendá-lo aos amigos é outra. Eu realmente gostei muito de Antichamber, mas não é tão fácil assim recomendá-lo para qualquer pessoa.

Parafraseando a Nextel: Antichamber é exclusivo de PC, é mouse e teclado, é abstrato, é lateral thinking, é puzzle psicológico, é não euclidiano, pode ser para você.

Depende de quem você é, ou melhor, do que gosta e de onde joga. Vou tentar me explicar.

Pré-requisitos

Para começar, depois de tantos jogos de Xbox 360, chegou a hora de falar de um exclusivo de PC. E é um daqueles PC games roots, que nem suporta gamepad, só mouse e teclado mesmo. Quando estiver jogando você vai perceber que a precisão do mouse é realmente imprescindível para resolver vários puzzles, então faz sentido que o jogo te obrigue a usá-lo desde o começo. Você tem que estar disposto a sair do sofá e sentar na frente do computador para jogar.

Além disso é um jogo relativamente "pesado". Meu notebook até tem um processador razoável e uma plaquinha de vídeo dedicada (A8-3500M / Radeon 6750M). É o suficiente para rodar outros indies como Trine com tudo no máximo em Full HD. Só que para rodar Antichamber eu tive que baixar a resolução para 720p. Mesmo assim ainda há alguns pontos (raros, é verdade) em que o jogo dá aquela engasgadinha. Por sorte, nada que tenha me impedido de apreciá-lo.

Em resumo, você não precisa de um PC Master Race, mas não vai ser qualquer Laptop da Xuxa que vai rodar.

Making of

Por mais mind bending que Portal seja, é fácil recomendá-lo. Além de ter saído em vários consoles, o jogo é muito intuitivo, a curva de aprendizado é perfeita e o próximo objetivo está sempre claro. Você nunca se sente desorientado ou confuso, por mais que não saiba como resolver um puzzle específico. Mérito da Valve e seu famoso método de olhar por cima do ombro dos testadores.

Alexander Bruce, criador de Antichamber, recebendo o troféu de
Excelência Técnica na IGF 2012 em seu já famoso terno rosa.

Antichamber é um indie desenvolvido por um cara só, que estava pensando em fazer um MOBA baseado em Snake, o famoso jogo da cobrinha! Só que, quando ele estava aprendendo a programar na Unreal Engine, ele cometeu um erro de principiante que resultou numa geometria não euclidiana.

Fascinado com o protótipo bugado, Alexander Bruce percebeu que o interessante não era como aquele mundo funcionava, mas como um jogador teria que tentar compreender as regras por trás dele. Eventualmente ele transformou o projeto num puzzle single player, focado na psicologia dos puzzles.

Metroidvania

Ao contrário de Portal, a curva de aprendizado de Antichamber é qualquer coisa. Puzzles difíceis e fáceis se intercalam de forma quase aleatória. O interessante aqui é que eles realmente te fazem pensar fora da caixa, questionar tudo no espaço ao seu redor.

Outra coisa que nunca fica clara é qual é o próximo objetivo. Em geral você está com vários puzzles em aberto a qualquer momento, e não tem como saber qual vai te levar a um beco sem saída, qual vai te levar de volta a algum lugar pelo qual você já passou e qual vai te fazer realmente progredir.

O lado bom é que, se você emperrar em um puzzle, sempre tem outros para tentar. Muitas vezes você simplesmente ainda não tem as ferramentas necessárias, ou não sacou uma das mecânicas que é explicada em outro lugar. Se você não estiver fazendo progresso, não faça cerimônia: vá explorar outras áreas do jogo, e volte quando tiver uma epifania.

O resto


Todos os elementos de design do jogo foram pensados para enfatizar os puzzles, sem nunca se sobrepor  ao prato principal do jogo.
  • Não há história nenhuma - é difícil pensar em uma apropriada onde caibam puzzles tão diversos e irreais quanto os de Antichamber.
  • A trilha e os efeitos sonoros são adequadamente sutis. Como um bom puzzle, o projeto auditivo é tranquilo para contrabalançar a possível irritação quando você estiver empacado em alguma parte.
  • O gráfico é apropriadamente abstrato e monocromático, lembrando a obra de M. C. Escher (assim como echochrome). Quando o jogo quer destacar alguma coisa, ele utiliza cores fortes. O resultado não é tão clean como Mirror's Edge, por exemplo. Acaba sendo mais psicodélico, mas é bem legal também.
  • Muitas vezes as cores em si são uma dica relacionada ao problema em questão... Não dá pra explicar mais sem começar a entregar algumas soluções, então vou parar por aqui. Aliás, o jogo costuma utilizar símbolos específicos para sinalizar as diferentes propriedades de cada lugar. Preste atenção nos detalhes à sua volta!

Minha principal crítica ao jogo é que ele é minimalista demais. Algumas coisas poderiam ser melhor explicadas. Eu pretendo dar minha parcela de contribuição aqui, esclarecendo o que eu penso que pode ser útil para você não começar tão perdido.

Antichamber 101


Quando carrega o jogo, você se vê num cômodo que funciona como se fosse o menu principal. Como a maioria dos cômodos, ele tem quatro paredes. A primeira, de vidro, te deixa ver três portas inacessíveis (numa das portas está escrito Exit). As outras três tem uma função mais prática.


A segunda parede tem um título presunçoso: tudo que você precisa saber. Mais ou menos, mais ou menos... Esta parede tem três seções verticais.
  • Do lado esquerdo estão listados os comandos, mas não são todos! Esse jogo exige que você tenha um mouse com wheel clicável (ou pelo menos com um terceiro botão no meio). Pelo menos essa parte vai ficar clara quando você chegar lá. Observe que o jogo chama esse cômodo inicial de antechamber com "e", ou seja, ante-sala, contrastando com o título do jogo.
  • No meio estão suas configurações. Se o jogo estiver lento, tudo que você pode fazer é diminuir a resolução. O resto eu preferi não mexer.
  • À direita tem um timer regressivo que começa em 90 minutos, com um botão de reset. Pelo jeito o autor só considerou seu speedrun digno de nota se você terminar o jogo em menos de uma hora e meia. Eu devo ter levado quase 10 vezes mais para apreciar tudo com calma. Não se preocupe, não há consequências depois que o timer zera. Você nem perde achievements, já que o jogo não tem nenhum. Pelo contrário, você até ganha um desenho.


Por falar em desenhos, a terceira parede é dedicada a eles. Não se esqueça de clicar em todos os desenhos que vir pelas paredes durante o jogo, para que eles sejam ativados neste mural! Os desenhos são uma das maneiras visuais de medir o seu progresso. A outra está na última parede...


Aqui temos um mapa, que carece desesperadamente uma legenda, então eu vou tentar explicar o que cada símbolo significa.
  • Quadrados grandes são salas que você ainda não completou.
  • Quadrados pequenos são salas que você já completou.
  • Pequenos círculos são becos sem saída.
  • Pequenos pedacinhos de caminho truncados, saindo de um quadrado e terminando abruptamente, são saídas que você ainda não encontrou.
  • Um X rodando indica a última sala na qual você entrou clicando no mapa.
  • Um círculo indica a sala na qual você estava antes de apertar Esc.
  • Entre o X e o círculo o jogo desenha uma linha cinza indicando o caminho que você percorreu.

Para fazer 100% em Antichamber, você deve achar todos desenhos e garantir que seu mapa está completo, sem quadrados grandes ou saídas não encontradas. Na verdade, ainda há outro tipo de segredos no jogo (os cubos rosa), mas não há como rastrear quais deles você já encontrou.

Veredito

Todo mundo gosta de dizer que tem mente aberta e pensa fora da caixa. Se no seu caso isso é verdade mesmo, não é só discurso, Antichamber é um jogo para você. Senão, deixe passar, pois ele só iria te irritar. E seja sincero, você não tem que provar nada para ninguém...

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